terça-feira, 4 de outubro de 2011

Leitura, análise e interpretação dos elementos do mapa temático

A informação visual possui uma linguagem própria e, por isso, para ser compreendida necessita ser aprendida. A leitura de representações gráficas depende da mensagem vinculada e dos objetivos de cada representação (ARCHELA, 1999 p. 6).
Os elementos que compõem um mapa temático são: título, legenda, convenções cartográficas, proporção e escala, imagem bidimensional do mapa, grade de coordenadas referentes à projeção cartográfica adotada e a documentação que foi fonte para sua elaboração. Neste sentido, o leitor necessita conhecer e compreender esses elementos para realizar a leitura, análise e interpretação de um documento cartográfico. A função de cada elemento no mapa é:
1. Título: O título deve informar ao leitor os fenômenos representados, os locais e a data de ocorrência.
2. Legenda: As informações disponibilizadas na legenda não devem causar dúvidas quanto aos objetos a que se referem.
A legenda deve ser colocada de forma que não sobreponha detalhes importantes do documento. Devem ser inseridas fora da área do conteúdo do mapa, assim como a escala, as fontes de informação, a orientação quanto ao norte, etc.
3. Convenções Cartográficas: As convenções cartográficas abrangem símbolos que representam os diversos elementos geográficos. Elas possibilitam sua representação, de maneira proporcional à sua importância. Deve-se ressaltar que a variedade e a quantidade de símbolos em um mapa devem ser sempre consideradas em função da sua escala.
Desta forma, o autor deverá utilizar, com o máximo rigor, as dimensões e quantidades de símbolos para manter a harmonia entre os seus elementos, não permitindo uma poluição visual.
Sempre que a escala permitir, os elementos geográficos deverão ser representados de acordo com a grandeza real e as particularidades de sua natureza.
4. Escala: Para Joly (1990, p. 22), a escala é um meio de representar, numa dada superfície de papel, uma maior ou menor porção do espaço. Para esse autor, todos os meios de expressão e todos os procedimentos de representação dependem da escala. Por isso, a mudança de escala exige uma revisão do sistema gráfico para manter a precisão de detalhes.
5. Imagens Bidimensionais: O termo mapa refere-se a uma imagem bidimensional (x,y), que mostra a localização dos objetos de um determinado setor da superfície da Terra.
Segundo Martinelli (2003, p. 35), as dimensões x e y do plano permitem identificar a posição do objeto ou lugar representado (Figura 1).

6. Fontes de informações: as fontes para elaborar mapas variam amplamente em tipo e quantidade, sendo classificadas em:
a) Fontes primárias: dados originais obtidos especificamente para a geração de um mapa.
b) Fontes secundárias: dados complementares obtidos de mapas, relatórios, censos já realizados para fins diversos e que são utilizados na elaboração de um mapa.
c) Fontes intermediárias: dados obtidos através de Sensoriamento Remoto, como imagens de satélite, fotografias aéreas, dentre outros. (MENEGUETE; MELO, 2003, p. 3).


A representação do espaço pela variável cor.

A variável COR possui um importante papel para as séries iniciais. Pela facilidade de associarem alguns elementos da paisagem e do espaço a determinadas cores. É comum, durante a elaboração de um croqui, desenho ou qualquer forma de representação, empregarem as clássicas tonalidades, verde para a vegetação, azul para a água e marrom para as montanhas.
A rosa cromática foi criada tendo como base o círculo das cores, onde, através da combinação de seis cores - violeta, azul, verde, amarelo, laranja, vermelho – obtém-se as nuanças que permitem a gradação de cores frias e quentes em um círculo.

Orientação no espaço geográfico pelo norte magnético e por pontos cardeais

Num passado longínquo, os primeiros navegantes partiam dos continentes e ficavam restritos ao litoral, com medo de se perderem em alto mar. Devido a esse motivo, começaram a observar os astros, com seus movimentos repetitivos e cotidianos, sempre nas mesmas direções. E desta forma começaram a utilizá-los como pontos de referência.
Sendo assim, em vista do tamanho da superfície da Terra como é possível alguém se orientar? Primeiro é preciso saber que orientar em Cartografia significa determinar a posição de um lugar, adaptando-se ou ajustando-se à direção dele com relação ao Norte. No dia-a-dia também pode significar dirigir, guiar, reconhecer ou examinar a situação de um lugar, ou da posição em que se acha, para guiar-se.
Ao se pensar nos mais antigos meios de orientação utilizados pelo homem pode-se reportar aos astros como o sol, as estrelas (Polar, Cruzeiro do Sul), etc. O uso do Norte como referência proliferou-se com o uso da bússola, instrumento antigo e ainda muito utilizado para orientação, que adota como referência o Norte Magnético. Antes da criação desse instrumento, os navegantes orientavam-se pelo sol durante o dia e pelas estrelas durante a noite, porém com chuva ou nebulosidade, não conseguiam se locomover pois perdiam a orientação.
Com base na observação do movimento do Sol, convencionaram-se alguns pontos chamados de pontos cardeais (Norte, Sul, Leste e Oeste). Onde o Sol nasce é chamado de nascente ou Leste (representado pela letra L ou E) e onde o Sol se põe é chamado de poente ou Oeste (O ou W). Além desses encontram-se, perpendicularmente a direção Leste-Oeste, os pontos cardeais Norte (N) e Sul (S).
Para visualizar os outros pontos cardeais a partir de Leste e Oeste deve-se abrir os braços da seguinte forma: posicione o corpo de maneira que o braço direito fique para Leste (E) ou nascente, direção onde nasce o sol. O braço esquerdo para Oeste (W). Sendo assim, à sua frente estará o Norte (N) e às suas costas estará o Sul (S). A partir destes pontos estabeleceram-
se os pontos colaterais, permitindo uma orientação mais precisa. São eles: Nordeste (NE), Sudeste (SE), Noroeste (NW); Sudoeste (SW). Desse modo, forma-se a “Rosa dos Ventos”

As diversas formas de observar os objetos no ambiente

Um objeto pode ser observado no ambiente, através de três pontos de vista: vertical, horizontal e oblíquo. Em seu dia-a-dia, as pessoas usam naturalmente esses três pontos de vista, mas muitas vezes, olham os elementos que compõem o seu ambiente cotidiano, sem notarem que estão utilizando conceitos básicos para a Alfabetização Cartográfica.

Relações espaciais topológicas elementares

As relações topológicas elementares devem ser introduzidas no Ensino Fundamental considerando-se primeiro do corpo da criança, partindo do seu ser e a partir dele para o seu entorno. Daí é possível abordar questões mais amplas envolvendo a classe, os ambientes da escola e o bairro.
As relações espaciais topológicas elementares são as relações espaciais que se estabelecem no espaço próximo, usando referenciais elementares como: dentro, fora, ao lado, na frente, perto, longe, etc. Tais relações estão presentes nas tarefas mais simples do dia-a-dia como, por exemplo, no deslocamento de um local a outro ou mesmo quando se busca a localização de objetos e sua orientação no espaço. Para se trabalhar com as relações topológicas deve-se considerar três noções elementares que são: lateralidade, anterioridade e profundidade.

As três noções elementares:
Lateralidade: corresponde à noção e direita e esquerda que uma pessoa deve desenvolver para se orientar (a direita de, à esquerda de).
Anterioridade: corresponde à noção de ordem e sucessão de objetos no espaço, a partir de um determinado ponto de vista (antes de, depois de, entre, a frente de).
Profundidade: corresponde à noção de posição com relação à variação na vertical (em cima, no alto, em cima de, sobre; abaixo de, o fundo de, debaixo de).

Percepção espacial da criança

Entender mapas ou associá-los a tarefas cotidianas não é fácil para crianças, principalmente na faixa etária entre 4 e 10 anos. Com isso, sem a atenção devida acabam por não relacionando o desenho ao espaço físico onde estão inseridas.
O desenho da criança não é uma cópia do real. Varia de criança para criança, dependendo de sua percepção do objeto de suas habilidades gráficas. Enquanto que, os adultos se preocupam em analisar fotografias aéreas, medir distância ou identificar pontos cardeais, por exemplo, os mapas infantis devem trazer elementos do mundo infantil, formulado pela própria criança, com diversidade de cores e formas.
Além de ter sua percepção do mundo, as crianças têm uma grande dificuldade na manipulação das linhas inclinadas ao desenhar objetos em três dimensões e na identificação de elementos e paisagens vistas de cima, pois apresentam uma aparência diferente da que estão habituadas.
Pode-se definir a Cartografia Infantil como sendo o ensino de diversas formas de representação espacial. O mapa é um veículo de informação espacial, cujo objetivo é preparar o aluno para compreender a organização espacial da sociedade.
Segundo Luquet, in: Almeida (2001), no primeiro momento a criança desenha para se divertir, em seguida, surge a necessidade de apropriar-se de um sistema de representação.
Pode-se dividir o desenvolvimento do desenho infantil em quatro fases:
1. Realismo fortuito ou atividade motora não simbólica;
2.  Incapacidade sintética;
3. Atividade simbólica;
4 . Realismo intelectual e visual. 

Os cegos e o elefante (História do Folclore Hindu)

Numa cidade da Índia viviam sete sábios cegos. Como os seus conselhos eram sempre excelentes, todas as pessoas que tinham problemas recorriam à sua ajuda.
Embora fossem amigos, havia uma certa rivalidade entre eles que, de vez em quando, discutiam sobre qual seria o mais sábio.
Certa noite, depois de muito conversarem acerca da verdade da vida e não chegarem a um cordo, o sétimo sábio ficou tão aborrecido que resolveu ir morar sozinho numa caverna da montanha. Disse aos companheiros:
- Somos cegos para que possamos ouvir e entender melhor que as outras pessoas a verdade da vida. E, em vez de aconselhar os necessitados, vocês ficam aí discutindo como se quisessem ganhar uma competição. Não aguento mais! Vou-me embora.
No dia seguinte, chegou à cidade um comerciante montado num enorme elefante. Os cegos nunca tinham tocado nesse animal e correram para a rua ao encontro dele.
O primeiro sábio apalpou a barriga do animal e declarou:
- Trata-se de um ser gigantesco e muito forte! Posso tocar nos seus músculos e eles não se movem; parecem paredes...
- Que palermice! - disse o segundo sábio, tocando nas presas do elefante.
- Este animal é pontiagudo como uma lança, uma arma de guerra...
- Ambos se enganam - retorquiu o terceiro sábio, que apertava a tromba do elefante.
- Este animal é idêntico a uma serpente! Mas não morde, porque não tem dentes na boca. É uma cobra mansa e macia...
- Vocês estão totalmente alucinados! - gritou o quinto sábio, que mexia nas orelhas do elefante. - Este animal não se parece com nenhum outro. Os seus movimentos são bamboleantes, como se o seu corpo fosse uma enorme cortina ambulante...
- Vejam só! - Todos vocês, mas todos mesmos, estão completamente errados!
- irritou-se o sexto sábio, tocando a pequena cauda do elefante.
 - Este animal é como uma rocha com uma corda presa no corpo. Posso até pendurar-me nele.
E assim ficaram horas debatendo, aos gritos, os seis sábios. Até que o sétimo sábio cego, o que agora habitava a montanha, apareceu conduzido por uma criança. Ouvindo a discussão, pediu ao menino que desenhasse no chão a figura do elefante. Quando tateou os contornos do desenho, percebeu que todos os sábios estavam certos e enganados ao mesmo tempo. Agradeceu ao menino e afirmou:
- É assim que os homens se comportam perante a verdade. Pegam apenas numa parte, pensam que é o todo, e continuam tolos!
Este texto pode servir como um bom começo para mostrar aos alunos a necessidade de padronização, através das escalas do mapa. Se cada um retratasse o território, a partir de sua própria percepção da realidade, nós teríamos inúmeros desenhos e seria impossível compreender a lógica de todos. Assim, as escalas, a projeção e os símbolos das legendas, foram padronizados para facilitar a leitura de todos. Desta forma, o aluno poderá compreender que ler um mapa é uma tarefa como qualquer outra, bastando que conhecer os mecanismos utilizados.
É possível afirmar que a dificuldade na orientação e na leitura dos mapas está relacionada com o conhecimento das partes não do todo?

Uma necessidade epistemológica: a distinção entre paisagem e espaço

A palavra paisagem é frequentemente utilizada em vez da expres­são configuração territorial. Esta é o conjunto de elementos naturais e artificiais que fisicamente caracterizam uma área. A rigor, a paisagem é apenas a porção da configuração territorial que é possível abarcar com a visão. Assim, quando se fala em paisagem, há, também, refe­rência à configuração territorial e, em muitos idiomas, o uso das duas expressões é indiferente.
Paisagem e espaço não são sinónimos. A paisagem é o conjunto de formas que, num dado momento, exprimem as heranças que repre­sentam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza. O espaço são essas formas mais a vida que as anima. (SANTOS.1999, p. 83)
A paisagem se dá como um conjunto de objetos reais-concretos. Nesse sentido a paisagem é transtemporal, juntando objetos passados e presentes, uma construção transversal. O espaço é sempre um pre­sente, uma construção horizontal, uma situação única. Cada paisagem se caracteriza por uma dada distribuição de formas-objetos, providas de um conteúdo técnico específico. Já o espaço resulta da intrusão da sociedade nessas formas-objetos. Por isso, esses objetos não mudam de lugar, mas mudam de função, isto é, de significação, de valor sistémico. A paisagem é, pois, um sistema material e, nessa condição, relativamente imutável: o espaço é um sistema de valores, que se transforma permanentemente.
Segundo Santos(1999, p. 83) O espaço, uno e múltiplo, por suas diversas parcelas, e através do seu uso, é um conjunto de mercadorias, cujo valor individual é função do valor que a sociedade, em um dado momento, atribui a cada pedaço de matéria, isto é, cada fração da paisagem.
O espaço é a sociedade, e a paisagem também o é. No entanto, entre espaço e paisagem o acordo não é total, e a busca desse acordo é permanente; essa busca nunca chega a um fim.
A paisagem existe através de suas formas, criadas em momentos históricos diferentes, porém coexistindo no momento atual. No espa­ço, as formas de que se compõe a paisagem preenchem, no momento atual, uma função atual, como resposta às necessidades atuais da so­ciedade. Tais formas nasceram sob diferentes necessidades, emanaram de sociedades sucessivas, mas só as formas mais recentes correspondem a determinações da sociedade atual.
A paisagem é história congelada, mas participa da história viva. São as suas formas que realizam, no espaço, as funções sociais. As­sim, pode-se falar, com toda legitimidade, de um funcionamento da paisagem, como, aliás, foi proposto por C. A. F. Monteiro (1991). Se o conhecimento, como diz Whitehead (1938, p. 225), "nada mais é que a análise do funcionamento dos funcionamentos", então o conhecimento da paisagem supõe a inclusão de seu funcionamento no funcionamento global da sociedade. A paisagem é testemunha da sucessão dos meios de trabalho, um resultado histórico acumulado. O espaço humano é a síntese, sempre provisória e sempre renovada, das contradições e da dialética social. O que nos interessa aqui mais de perto é que isto nos pode oferecer uma solução para o nosso problema epistemológico.
Uma casa vazia ou um terreno baldio, um lago, uma floresta, uma montanha não participam do processo dialético senão porque lhes são atribuídos determinados valores, isto é, quando são transformados em espaço. O simples fato de existirem como formas, isto é, como paisagem, não basta. A forma já utilizada é coisa diferente, pois seu conteúdo é social. Ela se torna espaço, porque forma-conteúdo.
Segundo Santos (1999, p. 88) Não existe dialética possível entre formas enquanto formas. Nem, a rigor, entre paisagem e sociedade. A sociedade se geografiza através dessas formas, atribuindo-lhes uma função que, ao longo da história, vai mudando. O espaço é a síntese, sempre provisória, entre o conte­údo social e as formas espaciais. Mas a contradição principal é entre sociedade e espaço, entre um presente invasor e ubíquo que nunca se realiza completamente, e um presente localizado, que também é passado objetivado nas formas sociais e nas formas geográficas en­contradas.
Quando a sociedade age sobre o espaço, ela não o faz sobre os objetos como realidade física, mas como realidade social, formás-conteúdo. isto é, objetos sociais já valorizados aos quais ela (a sociedade) busca oferecer ou impor um novo valor. A ação se dá sobre objetos já agidos, isto é, portadores de ações concluídas mas ainda presentes. Esses objetos da ação são, desse modo, dotados de uma presença humana e por ela qualificados.
A dialética se dá entre ações novas e uma "velha" situação, um presente inconcluso querendo realizar-se sobre um presente perfeito. A paisagem é apenas uma parte da situação. A situação como um todo é definida pela sociedade atual, enquanto sociedade e como espaço.
Em cada momento, em última análise, a sociedade está agindo sobre ela própria, e jamais sobre a materialidade exclusivamente. A dialética, pois, não é entre sociedade e paisagem, mas entre sociedade e espaço. E vice-versa.
Pensar sobre essas noções de espaço pressupõe considerar a compreensão subjetiva da paisagem como lugar: a paisagem ganhando significados para aqueles que a vivem e a constroem. Segundo os PCN’s (1998, p.78):
As percepções que os indivíduos, grupos ou sociedades têm do lugar nos quais se encontram e as relações singulares que com ele estabelecem fazem parte do processo de construção das representações de imagens do mundo e do espaço geográfico. As percepções, as vivências e a memória dos indivíduos e dos grupos sociais são, portanto, elementos importantes na constituição do saber geográfico.
Assim, o estudo de uma totalidade, isto é, da paisagem como síntese de múltiplos espaços e tempos deve considerar o espaço topológico — o espaço vivido e o percebido — e o espaço produzido economicamente como algumas das noções de espaço dentre as tantas que povoam o discurso da Geografia.

O espaço: sistemas de objetos, sistemas de ação


Para Santos (1999, p. 40) O uso dos objetos através do tempo mostra histórias sucessivas desenroladas no lugar e fora dele. Cada objeto é utilizado segundo equações de força originadas em diferentes escalas, mas que se realizam num lugar, onde vão mudando ao longo do tempo. Assim, a maneira como a unidade entre tempo e espaço vai dando-se, ao longo do tempo, pode ser entendida através da história das técnicas: uma história geral, uma história local. A epistemologia da geografia deve levar isso em conta. A técnica nos ajuda a historicizar, isto é, a considerar o espaço como fenómeno histórico a geografizar, isto é, a produzir uma geografia como ciência histórica. Assim pode-se também produzir uma epistemologia geográfica de cunho historicista e genético, e não apenas historista e analítico.
E. Ullmann (1973, p. 126) afirma que o espaço é "uma dimensão mais concreta do que o tempo". E, no entanto, sendo irreversível, está à altura de "medir" o tempo e, vice-versa, de ser medido em termos de tempo. O problema está todo aí. Não se trata propriamente de apurar qual dos dois é mais concreto. A questão da medida recíproca pode ser vista como uma maneira de dizer que tempo e espaço são uma só coisa, metamorfoseando-se um no outro, em todas as circunstâncias. Mas se queremos ir além do discurso e operacionalizá-lo para que se torne um conceito eficaz, temos de igualar espaço e tempo, isto é, tratá-los segundo parâmetros comparáveis.
Segundo Santos(1999, p. 45) O espaço é formado de objetos técnicos. O espaço do trabalho contém técnicas que nele permanecem como autorizações para fazer isto ou aquilo, desta ou daquela forma, neste ou naquele ritmo, se­gundo esta ou outra sucessão. Tudo isso é tempo. O espaço distância é também modulado pelas técnicas que comandam a tipologia e a fun­cionalidade dos deslocamentos. O trabalho supõe o lugar, a distância supõe a extensão; o processo produtivo direto é adequado ao lugar, a circulação é adequada à extensão. Essas duas manifestações do espaço geográfico unem-se, assim, através dessas duas manifestações no uso do tempo.
As técnicas participam na produção da percepção do espaço, e tam­bém da percepção do tempo, tanto por sua existência física, que marca as sensações diante da velocidade, como pelo seu imaginário. Esse imaginário tem uma forte base empírica. O espaço se impõe através das condições que ele oferece para a produção, para a circulação, para a residência, para a comunicação, para o exercício da política, para o exercício das crenças, para o lazer e como condição de "viver bem". Como meio operacional, presta-se a uma avaliação objetiva e como meio percebido está subordinado a uma avaliação subjetiva. Mas o mesmo espaço pode ser visto como o terreno das operações individuais e coletivas, ou como realidade percebida. Na realidade, o que há são invasões recíprocas entre o operacional e o percebido. Ambos têm a técnica como origem e por essa via nossa avaliação acaba por ser uma síntese entre o objetivo e o subjetivo.
Através do processo da produção, o "espaço" torna o "tempo" concreto. Assim, a noção de trabalho  e a de instrumento de trabalho são muito importantes na explicação geográfica, tanto ou mais do que no estudo dos modos de produção. O trabalho realizado em cada épo­ca supõe um conjunto historicamente determinado de técnicas. Segun­do uma frase muito frequentemente citada de Marx (Capital, I, p. 132, edição de M. Harnecker), "o que distingue as épocas econômicas umas das outras, não é o que se faz, mas como se faz, com que instrumentos de trabalho". Esta noção tem, pois, um valor histórico e espacial. A cada lugar geográfico concreto corresponde, em cada momento, um conjunto de técnicas e de instrumentos de trabalho, resultado de uma combinação específica que também é historicamente determinada.
Nossa proposta atual de definição da geografia considera que a essa disciplina cabe estudar o conjunto indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ação que formam o espaço. Não se trata de sis­temas de objetos, nem de sistemas de ações tomados separadamente. Nem tampouco se trata de reviver a proposta de Berry & Marble (1968) fundada na teoria de sistemas então em moda e segundo a qual "todo espaço consiste em um conjunto de objetos, os caracteres desses objetos e suas inter-relações" (citados por J. Beaujeu-Garnier, 1971, p. 93).
Segundo Santos (1999, p. 51) O espaço é hoje um sistema de objetos cada vez mais artificiais, po­voado por sistemas de ações igualmente imbuídos de artificialidade, e cada vez mais tendentes a fins estranhos ao lugar e a seus habitantes.Os objetos não têm realidade filosófica, isto é, não nos permitem o conhecimento, se os vemos separados dos sistemas de ações. Os siste­mas de ações também não se dão sem os sistemas de objetos.
Para os geógrafos, os objetos são tudo o que existe na superfície da Terra, toda herança da história natural e todo resultado da ação humana que se objetivou. Os objetos são esse extenso, essa objetividade, isso que se cria fora do homem e se torna instrumento material de sua vida, em ambos os casos uma exterioridade.
A ação é um processo, mas um processo dotado de propósito, segundo Morgenstern (1960, p. 34), e no qual um agente, mudando alguma coisa, muda a si mesmo. Esses dois movimentos são conco­mitantes. Trata-se, aliás, de uma das ideias de base ou Marx e Engels. Quando, através do trabalho, o homem exerce ação sobre a natureza, isto é, sobre o meio, ele muda a si mesmo, sua natureza íntima, ao mesmo tempo em que modifica a natureza externa.